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O legado da visita do Papa Francisco ao Brasil

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Helena (garotinha de cinco anos): Papai, o Papa Francisco esta indo embora?

Rodrigo (seu pai): Sim, amor, está indo pra casa dele, lá em Roma, na Itália.

Helena: Aaaah… Vou sentir saudades dele, papai…

Rodrigo: (sem palavras) …

Acreditamos que muitos de nós poderíamos ser os protagonistas destas falas, da filha do meu amigo, que traduzem bem o sentimento que estamos experimentando depois destes dias inesquecíveis da visita do Papa Francisco ao nosso país, que nos envolveu, e arrebatou com sua inquestionável simplicidade, já conhecida de todos desde sua aparição na sacada do Vaticano, e que se reafirmou aqui, desde a escolha de um carro simples até o gesto de segurar sua própria “malinha” ao subir ao avião que o levaria de volta; seu coração aberto e abraços acolhedores que pareciam “encontrar”, em meio à multidão, com aquela criança, aquele idoso, aquele deficiente, enfim, todos que se aproximavam dele e ele não os rejeitava nunca, para “desespero” de sua segurança; sua contagiante alegria e esperança que o fazia vencer o cansaço e estampar no rosto um sorriso marcante e constante;  sua firmeza e lucidez na proposição de uma evangelização realmente eficaz,  transformadora e inclusiva, sobretudo, para os mais pobres, manifestada na sua visita à Favela da Varginha, à receptividade aos indígenas, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, às autoridades que o receberam, em diversos momentos.

Um dos momentos mais contundentes ocorreu no sábado, dia 27, antes do encontro com os jovens na vigília na praia de Copacabana, foi o encontro com 300 Bispos brasileiros e a Presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, na sede do Arcebispado do Rio de Janeiro.

O Papa leu o seu mais longo e denso discurso enfocando diversos aspectos da Igreja no Brasil, iniciando por Aparecida, “(…) onde Deus deu também uma lição sobre si mesmo, sobre seu modo de agir. Uma lição sobre a humildade que pertence a Deus como traço essencial: ela está no DNA de Deus”. O documento aborda diversos tópicos, como o apreço pelo percurso da Igreja no Brasil, e os desafios da Igreja no Brasil, além de abordar temas como a Colegialidade, a missão, a função da Igreja no Brasil e na Amazônia. O encontro não foi gravado em áudio ou vídeo, a pedido do Papa. “A força da Igreja não está em si mesma, mas esconde-se nas águas profundas de Deus nas quais é chamada a lançar as redes”, destacou o Papa Francisco relacionando sua mensagem à história do aparecimento da imagem de Nossa Senhora de Aparecida, no rio Paraíba, em 1717.

Ressaltamos ainda em suas falas, geralmente breves, mas cheias de conteúdo passados de forma simples, carregadas de parábolas, comunicando-se de maneira envolvente e contundente: “Bote fé: o que significa? Quando se prepara um bom prato e falta o sal, você então bota o sal; se falta o azeite, então bota o azeite. Botar é colocar, derramar.” O papa afirmou que o mesmo processo ocorre na vida, que também precisaria ser “temperada” com elementos espirituais para ser plena. “Bote fé e a vida terá um sabor novo, terá uma bússola que indica a direção. Bote esperança, e todos os seus dias serão iluminados.”

Papa Francisco salientou em suas colocações as figuras do jovem e do idoso que ele disse serem esquecidos e deixados de lado pela sociedade pragmática e capitalista, pois aquele ainda não produz e este não produz mais. No entanto, os idosos têm a sabedoria da vida e os jovens têm o futuro a construir no presente, aqui e agora.

Lembrando de sua passagem entre nós, nos remetemos aos discípulos de Emaús, que caminhavam tristes pela morte do Mestre, mas ao vê-lo caminhando do seu lado, sentiram  o coração arder enquanto Ele lhes falava e estava com eles. (Cf. Lc 24,13-35). Só que esta experiência se estendeu à pregação dos Seus ensinamentos, já que eles foram testemunhas de Sua Ressurreição.

Depois de sua estada entre nós, pensamos que seu legado reside no fato de nós aceitarmos também sua convocação para uma missão, a de sairmos de nós mesmos, de nosso egoísmo; de nos envolvermos na política, como uma obrigação de cidadãos e cristãos, para não fazermos como Pilatos e lavar as mãos, e, assim, irmos até as periferias da existência, promovendo a cultura do encontro, pensando a ação a partir da periferia, daqueles que estão mais afastados, construindo comunidades mais simples e com efetiva participação feminina, ativa em debates como educação, saúde e paz social.

E se assim o fizermos, poderemos encontrar na nossa fé sentido e plenitude, na nossa vida um sabor novo, uma bússola que indica a direção, para nossos dias serem iluminados, nosso horizonte não ser mais escuro, nosso caminho ser alegre porque botamos fé, esperança e amor em nossas ações, conforme Papa Francisco nos exortou.

*Armindo Boll, morador da Saúde, é historiador, filósofo, teólogo

Papa Francisco, durante visita à comunidade da Varginha, no Rio de Janeiro: carinho mútuo

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