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História

Diretas já: o povo nas ruas pela construção da democracia

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De quem essa ira santa
Essa saúde civil
Que tocando a ferida
Redescobre o Brasil?
Quem é esse peregrino
Que caminha sem parar?
Quem é esse meu poeta
Que ninguém pode calar?
Quem é esse?
(música “Menestrel das Alagoas”, de Fernando Brant e Milton Nascimento, feita em homenagem a
Teotônio Vilela, um dos personagens marcantes do Movimento das Diretas Já)

Diretas Já foi um movimento civil de reivindicação por eleições presidenciais diretas no Brasil ocorrido em 1983-1984, que teve motivação política, econômica, social e cultural , pois o longo período de ditadura militar pelo qual o país passou, com uma recessão crescente, salários baixos, inflação de 239% (!), contribuiu para a acelerar a mobilização de entidades de classe, sindicatos, parte da Igreja Católica, nas CEBs – Comunidades Eclesiais de Base, vários movimentos sociais, partidos políticos e cidadãos comuns, artistas e intelectuais, todos profundamente comprometidos com a redemocratização do Brasil, proposta pela emenda constitucional Dante de Oliveira, em 02 de março de 1983.
Apesar da memória coletiva nacional lembrar sobretudo os grandes comícios de 1984, temos que esclarecer que, já em 31 de março de 1983, acontecia a primeira manifestação pública exigindo eleições diretas, no recém emancipado município de Abreu e Lima, em Pernambuco, organizada por membros do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, noticiada pelos jornais do Estado. Em seguida, ocorria outra manifestação em 15 de junho do mesmo ano, em Goiânia e, ainda outras, em novembro, em Curitiba e em São Paulo. O então presidente do Brasil, Gal. João Batista de Figueiredo, foi à televisão declarar subversivas estas manifestações. Mas, como diz o ditado popular, o feitiço virou contra o feiticeiro, e grande parte da população brasileira acaba por simpatizar com a causa e amplia em muito as mobilizações que começam a pipocar por todo o território nacional, mesmo com a censura, com as prisões e violência policial contra os manifestantes o movimento começa a se agigantar e fugir do controle da ditadura.
Em virtude disso, ampliam-se as adesões ao movimento, como o bloco da dissidência da ARENA – partido da Aliança Renovadora Nacional, além de militares do baixo escalão, e parte da imprensa que, até então não cobria as mobilizações, como a própria Rede Globo, que teve que ouvir nas concentrações populares o refrão “o povo não é bobo, abaixo a Rede Globo”.
Particularmente dois desses comícios marcaram a trajetória do movimento – o da Candelária, no Rio de Janeiro, em 10 de abril de 1984 e o do Vale do Anhangabaú, em 16 de abril do mesmo ano, em São Paulo, pois conseguiram reunir juntos, quase três milhões de manifestantes, que se reuniram com absoluta civilidade e fervor cívico, sem absolutamente nenhuma ocorrência de violência ou quebra quebra. Estivemos por lá e até hoje nosso coração pulsa forte com grande emoção ao lembrarmos daqueles meses que nós, brasileiros, pudemos nos orgulhar de sermos protagonistas deste momento impar, marcante e inesquecível de nossa história.
Em 25 de abril de 1984, foi votada a emenda Dante de Oliveira pelas Diretas Já, com transmissão pelas emissoras de TV, que foi interrompida por um “surpreendente” blecaute de energia que impediu o acompanhamento desta votação, cujo resultado frustrante e lamentável não respondeu aos anseios populares.
Mais uma vez os conchavos políticos não consideraram a participação popular e excluíram o povo das grandes decisões nacionais. Tivemos que “engolir” um presidente eleito indiretamente pelo Congresso Nacional – que não nos representava em sua maioria – e que, por grande ironia, acabou não tomando posse, tendo que assumir o seu vice, vindo da ARENA dissidente.
Não obstante esta amarga frustração vivida pelos brasileiros que tão ordeira e convictamente foram para as ruas exigindo a redemocratização do país, fica o saldo histórico de que podemos, mesmo com a as diferenças, podemos nos reunir em torno de um projeto nacional que transcenda interesses partidários e de qualquer ordem que seja para o bem do Brasil.
Por isso, consideramos importante guardar a memória daqueles acontecimentos para que as gerações futuras possam conhecê-los e aprender com eles.

* Armindo Boll – Morador do distrito da Saúde, Historiador e Filósofo

 

Foi durante o mandato do presidente Costa e Silva que o Ato Institucional número 5 – o AI5 – foi assinado, em dezembro de 1968

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